(voz: Julia Pastore)
Se eu nascesse amanhã,
arquiteto ou construtor,
poeta, pintor ou narrador,
faria da Terra um planeta
sem rusgas e sem arestas
Não projetaria para ele
um campo de rosas que
resistissem aos furacões.
Buscaria a beleza da
fragilidade, a ligeireza
e a limpidez das cores,
a suavidade dos gestos.
Onde houvesse força,
desenharia aflições;
onde houvesse nação,
descobriria gente.
Não reservaria um espaço
para o sucesso, para o poder
ou para os tempos de glória.
Escreveria a história
pelos lados da paixão.
Rejeitaria a indiferença,
as reservas e a malícia.
Não precisaria de uma
paisagem para sustentar
sonhos de grandeza e
de afirmação retórica.
Montanhas e planícies
enfeitariam como aqui
os quadros do cenário.
Dinheiro, melhor seria
eliminá-lo, se possível
junto com a pretensão.
Se eu nascesse amanhã,
estenderia um tapete
branco para a humildade.
A imaginação ocuparia
um lugar de destaque,
e a sensibilidade venceria
da inteligência entre as
virtudes do caráter.
Se eu nascesse amanhã,
lançaria contra a miséria
as armas da infantaria.
Mas se um dia descobrisse
que o ontem está no hoje e
que ambos se encontram no
depois, no rastro do infinito,
se me alcançasse a certeza
da inutilidade dos projetos,
com a derrota de todos os
esforços e romantismos,
não diria: Chega. Nem: Desisto.
Mesmo que fosse
apenas para me enganar,
sentaria diante de um piano
e, com as notas que ignoro e um talento
que não possuo, experimentaria uma multidão
de sons contraditórios
na execução de uma peça
em busca da harmonia.
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