Ronaldo Lima Lins

Doutor pela Sorbonne (Universidade de Paris III), tem pós-doutorado na École de Hautes Études en Sciences Sociales e ocupa a posição de Pesquisador IA do CNPq. É Titular de Teoria da Literatura da Faculdade de Letras da UFRJ, instituição que dirigiu por duas vezes. Publicou obras de ficção (Os grandes senhores; Material de aluvião, ambos em Portugal; A lâmina do espelho; As perguntas de Gauguin; Jardim Brasil: conto) e ensaio (O teatro de Nelson Rodrigues, uma realidade em agonia; Violência e literatura; Nossa amiga feroz,breve história da ‘felicidade’ na expressão contemporânea, O felino predador, ensaio sobrea história maldita da verdade, A indiferença pós-moderna, e A construção e a destruição do conhecimento). Seu último livro (de poesias) chama-se Mais do que a areia menos do que a pedra (Editora 7 Letras).

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Tijolo por tijolo

(voz: Rayssa Galvão)

A casa onde habito
é a possível.
Não é a dos meus sonhos.

Foi construída
tijolo por tijolo,
sem que eu soubesse
como ou por quê.

Não usei engenheiros
ou arquitetos
e não tirei licença
na Prefeitura.

Não empreguei
argamassa, pedra,
madeira ou cimento.
Nem a projetei.

Ela se ergueu.

Quando vi,
estava lá.

Tinha nome,
certidão de nascimento
várias cicatrizes,
alguns sacos
de entulho a descartar,
de momentos
espalhados pelos cantos.

Nela me abrigava
como num castelo.
Somente ao sair
descobria que precisava
de pessoas,
de movimento,
das formas do mundo.


Estranha casa essa,
sem planejamento,
cálculo das estruturas,
frágil e sólida
ao mesmo tempo.

Graças a ela,
com as portas e janelas abertas.
escrevo o que represento.

Procuro ser sincero,
sem retoques nas cores
e no desenho original.
Não me importa
o impacto que exerço
sobre os vizinhos.

Não é casa
que alguém defenda,
além de mim,
é claro.
Não aparece
nos manuais de arquitetura,
protegida
pelas leis do patrimônio
nas áreas de preservação.

É onde moro.
Ali sou
o que nunca sou
fora dali.

Quando a observo,
curvando-me
sobre mim mesmo,
vejo que
(apesar dos raios
nas tempestades,
do sol no verão,
do frio e do calor)
-- enquanto não lhe chega
a hora,
aprendeu a resistir.
Tem as minhas medidas:
metros de comprimento,
pouco menos de largura
e uma alma
que me faz
melhor do que sou.

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